- Tenho certeza de que Mercedes está bem. Agora precisa descansar e amanhã te levarei à escola.
- Não quero ir para a escola. Você não sabe preparar o lanche e serei a única garota sem mãe, ou madrasta.
- Sua avó morreu há dois anos e minha mãe há muito tempo. Sua mãe e eu nunca deixamos de estudar.
- Você fica comigo, até eu dormir?
- Claro.
Carlo olhou Raquel adormecer aos poucos, a cada momento mais sonolenta.
- Carlo Vitor... – Raquel Maria.
- Sim querida. – Carlo Vitor.
- Você cuida de mim?
- Claro, todo o tempo. Cuidarei de você, sempre.
- Mercedes te chamava de chato, por sempre ter razão.
- Verdade?
- E que era verdade que você gostava muito de mim.
- Acho que ela estava certa.
Raquel Maria dormiu, finalmente, com Carlo Vitor alisando seus cachos negros. Após contemplá-la desce ao bar sem o movimento de final de semana por ser segunda-feira.
- Deus... Uma tequila Paolo. E tome. – Carlo.
- ¿Que esto, dinero adelantado? – Paolo.
- Raquel fez compras em seu nome, hoje.
- Hum... ¿Adentre nosotros, la niña es mismo su hija?
- Sim Paolo. A mãe dela é Mercedes, lembra dela?
- ¡Si, si! Muy bella cuando chica.
- É. Ela me enfeitiçou com aqueles olhos negros. Fiquei cego de amor ou... O que quer que fosse.
- Y por causa del que cerraran?
- Eu vi em tempo quem ela era. Mas a menina já estava pronta.
- ¿Por causa de que no miraba la niña?
- Mercedes não queria. Eu sempre ocupado, sem ter como cegar até Raquel Maria... Muitas coisas.
- ¡Yo sé, yo sé!
- É, mas eu sempre gostei da tampinha. Mercedes só me permitiu que eu a visse até completar cinco amos, quando o outro filho morreu.
- ¿Ella tenía otro hijo?
- Sim, de quatorze anos.
- ¿Esto era tuyo?
- Não, não. Mas eu também o registrei. O rapaz se meteu com as pessoas erradas e acabou assassinado. Mercedes é, era, meio confusa, irresponsável demais. Fico feliz em Raquel não ter seguido o mesmo caminho que o irmão, mas se convivessem algum tempo mais, com Mercedes também, ela teria se perdido, e eu não poderia fazer nada.
- ¿Qué hará ahora?
- É minha filha! Tenho que cuidar dela. Já levei tanta coisa para ela sem que sequer soubesse. A mãe gastava todo dinheiro em cigarros, depois me ligava quando não tinha mais o que comer. Mas agora Mercedes está morta e enterrada, Raquel Maria está comigo e irá a escola todos os dias. Comerá o melhor possível, e não terá vícios. Acredita que quando voltávamos do cemitério hoje ela me tirou o cigarro, e o tragou? Do mesmo jeito que ia fazer com a bebida.
- ¡Que diaba!
- E antes de dormir... Estava preocupada sem saber para onde Mercedes havia ido. Disse que com certeza estava no céu, mas ela revelou que a mãe não queria ir para o céu.
- ¿Pero cómo?
- E o inferno seria ruim demais, porque é quente e terrível. Nem o purgatório seria bom, para Raquel, a mãe cansaria de esperar.
- ¡Que niña picara!
- E como... Ela ganhou de mim no baralho. Mercedes sempre foi melhor que eu. Você pode me ajudar com ela?
- ¡Hago el posible!
- Obrigado. Vou voltar lá pra cima. Amanhã alguém tem que ir à escola logo cedo. Outra coisa, eu fiz um acordo que permitia a Raquel beber licor e vinho.
- ¿Tu permitiste?
- Sim, mas... Quero que dilua o vinho em suco de uva. O licor que ela quer é de chocolate com mel, então... Lhe de achocolatado com mel misturado ao licor. Ela é esperta, mas eu sou mais.
- Estas cierto.
- Obrigado Paolo. Boa noite.
Carlo Vitor sobe notando que não tem onde dormir, mas pela manhã não é diferente de quando ele estudava todos correndo.
- Raquel, acorde. Está atrasada para a escola. – Carlo Vitor.
- Não quero ir. – Raquel Maria.
- Tem que ir à escola, ou vai crescer orelhas de burro em você.
A menina parou encarando-o.
- Mentira. – Raquel Maria.
- É, mas ainda assim tem que ir à escola. – Carlo Vitor.
- Eu não estou me sentindo bem.
- Isso também me cheira a mentira.
- Mas estou dizendo a verdade, minha garganta está doendo.
- Hum, abra a boca.
Ela obedece, mas não há nada nela, então passa a mão pelo rosto para verificar a temperatura.
- Você está ótima, pare de inventar desculpas. Tenho que trabalhar e Paolo não poderá ficar com você. – Carlo Vitor.
- Não estou me sentindo bem!
- Vamos logo Raquel. Já vi que terei que levar a caminhonete de Paolo para não chegar tarde.
Carlo faz com que Raquel se vista rápido, mas não leva a caminhonete de Paolo. Ambos vão de ônibus com Raquel cochilando encostada ao vidro.
- Agora seja uma boa garota e se comporte. Quer que eu venha buscá-la ou você toma o ônibus escolar. – Carlo Vitor.
- Quero ir para casa agora. – Raquel Maria.
- Com tanta vontade de voltar eu vou achar que você consegue ir andando. Podia usar essa força para estudar um pouquinho.
- Por favor...
- Se não voltar agora pra escola você vai abandoná-la pra sempre e eu não quero que seja uma ignorante.
- O que é ignorante?
- Uma ótima pergunta para fazer à sua professora.
- Carlo...
A última tentativa da garota não deu certo.